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Nuclear Assault ::: 25 e 26/04/19 ::: Sesc Belenzinho (Comedoria)
Postado em 14 de maio de 2019 @ 11:23


Texto: Vagner Mastropaulo

Fotos: Flavio Santiago

Agradecimentos: Poliana (Sesc Belenzinho)

O aniversário era de Nick, mas presenteados foram os fãs!

 “Caraca, mano! Nuclear Assault!!!”… foi assim que um abismado e vibrante fã dirigiu-se a este escriba no acesso à área interna da Comedoria na primeira das duas noites do grupo nova-iorquino no Sesc Belenzinho. Seu entusiasmo era tamanho ao provavelmente vê-los pela primeira vez que sua dificuldade de locomoção, mancando da perna direita, não o afetava de forma alguma, ilustrando o quanto o heavy metal une pessoas e afasta diferenças. E o clima de ansiedade era tangível ainda nas cercanias do complexo, justificando o desaparecimento quase instantâneo da cota de 20% do total de ingressos vendida pela internet em 16/04 e o subseqüente esgotamento das entradas no dia seguinte, nos pontos de vendas físicas das unidades, ainda que a capacidade oficial para cada apresentação fosse pequena: 650 pessoas de acordo com a divulgação do evento no site institucional, confirmada por uma controladora no acesso ao show no segundo dia.

Reforçaram a procura pelos escassos bilhetes o preço módico de trinta reais (quando a média dos mesmos no circuito Carioca Club / Tropical Butantã / Fabrique hoje beira os 130) e o status cult do quarteto adquirido com o passar dos anos, até pelo extremo bom humor que caracteriza as performances informais e profissionais do Nuclear Assault, sem se levar demasiadamente a sério, em fato corroborado por fatores externos após uma pesquisa corriqueira: a) pouco antes da turnê pelo Brasil, o texto em inglês no Wikipedia classificava a banda como “semi-aposentada”, muito em função das declarações de Dan Lilker sobre o assunto em 2014 (o texto foi alterado desde então); b) de acordo com o site www.sestlst.fm, F# não foi completada em 20/01/18, no Saint Vitus Bar, Brooklyn (NY), porque o baterista se levantou para “dar uma mijada”; c) e o próprio anúncio no site do Sesc trazia os músicos em foto totalmente descompromissada, com Dan Lilker sequer olhando para a câmera, absorto em pensamentos. Tudo isso apenas contribui para a aura desencanada do grupo, ao mesmo tempo em que, paradoxalmente desperta o interesse dos fãs. E antes de conferirmos o que de fato rolou, uma ressalva: embora nossa equipe tenha estado no Sesc nas duas noites, o foco deste texto está no dia 25, quinta-feira, data para a qual fomos credenciados. Mesmo assim, no final da resenha, daremos uma breve pincelada no que rolou de diferente no dia seguinte.

Sem banda de abertura e retornando à cidade após a passagem pela Clash em agosto de 2015, o show começou pontualmente às 21:30, como agendado, com o citado Dan Lilker no baixo, John Connelly (vocais e guitarras), Erik Burke (guitarra) e Nicholas “Nick” Barker (bateria) subindo ao palco já para mandar Rise From The Ashes, após o frontman calmamente fitar cada um de seus colegas, certificando-se de que tudo estava em ordem. Seu tão característico timbre de voz segue esganiçado, mas é Dan Lilker quem incorpora o espírito-metal no conjunto, em som matador no baixo aliado à atitude no palco, sem deixar de colaborar nos backing vocals, como em Brainwashed, quando a roda já comia solta. Pondo em poucas palavras, o cara simplesmente representa e ao ver figuras como ele e Robb Flynn (Machine Head) ao vivo, você tem a mais absoluta certeza que eles estariam agitando na pista com você, caso não estivessem trabalhando. Pedindo a palavra, ele fez um lembrete acerca de sua lendária estréia em solo nacional: “Muito obrigado! Beleza, eu vou dizer lentamente: no próximo mês completam-se trinta anos desde o Dama Xoc. Alguém aqui estava na porra do Dama Xoc?”. A título de curiosidade, para quem quiser conferir, filmagens em VHS das duas apresentações encontram-se disponíveis na íntegra no YouTube, obviamente não primando pela qualidade de vídeo e áudio, mas valem pelo registro histórico.

Diferente do mencionado show no Brooklyn, F# foi aqui tocada sem maiores intercorrências, fechando a terceira consecutiva de Survive (1988). E já dando um adianto à leitura (ou um spoiler mesmo), nada de Out Of Order (1991), Something Wicked (1993) e Third World Genocide (2005) seria incluído nas duas noites. Ao seu final, Dan anunciou “uma bem antiga”, mas foi atravessado pelo vocalista em agradecimentos “ao Ministério da Cultura brasileiro por nos trazer para fazer estes shows. É sempre um prazer vir ao lindo país de vocês e agradecemos que vocês tenham vindo nos ver. Muito obrigado pelo apoio nestes anos todos”. As palavras de John foram tão sinceras que fizeram Nick se levantar de seu kit, em sinal de respeito, e só então começaram Vengeance, seguida de After The Holocaust, não sem antes o baixista erguer seu celular para registrar o momento, com a ajuda de John, a pedir para que iluminassem a platéia (sabe lá Deus em qual língua) e terminar a prestação de serviços com um “Grazie”. Ao anunciá-la, incomodado com insistentes pedidos por Critical Mass, Dan Lilker foi atrapalhado: “Esta se chama… mais tarde, mais tarde! Tenham paciência, galera”, forçando o vocalista entrar na zoeira: “Mas nós não temos uma chamada ‘Mais tarde, mais tarde! Tenham paciência, galera’”.

Após as duas seguidas de Game Over (1986), rolaram novos clamores por Critical Mass, forçando o baixista a caprichar no espanhol: “Dos más, dos más”. A sensacional New Song foi a primeira de Handle With Care (1989), acelerando ainda mais a roda no lado direito da pista, até que o rolo compressor Critical Mass fosse finalmente tocado, acalmando os mais apreensivos e trazendo lembranças a quem via seu clipe no saudoso Fúria Metal, no auge da MTV. A faixa simplesmente arrancou urros de aprovação e houve quem erguesse as mãos para o alto tanto em sinal de gratidão quanto em reverência. Saciada a ânsia coletiva, o vocalista deu um sério recado, combinando inglês e espanhol: “Se vocês quiserem vir ao palco para um stage diving, por mim, tudo bem ‘no problema’. Se quiserem subir para cantar conosco, são muito bem-vindos. Façam! Mas, por favor, tomem cuidado com o equipamento. E se alguém fizer um stage diving, não façam isso [nota: em gesto de ‘tirar o corpo fora’ para que alguém se estatelasse no chão], pois isso é uma merda!”.

Ao anunciar a próxima, de 1987, Dan tirou onda: “Do EP The Plague, cantem conosco, se quiserem”, reforçado por John: “Todos, cantem conosco!”. E começaram a instrumental Game Over, estrategicamente posicionada com meia hora de set, até para dar um respiro ao gogó do cantor. E cumprindo o combinado, um garoto subiu no palco e se jogou na platéia, que o agarrou. Butt Fuck, do mesmo EP, veio a seguir, parcialmente cantada pelo baixista e, cá entre nós, precisa de culhão e senso de humor para meter um blues em algo com tal título. Ainda sem terminá-la, mais gente vinha ao palco, incluindo uma garota de sutiã à mostra, sem blusa, e que cumprimentou Dan Lilker, forçando comentário hilário do vocalista: “Isso é algo que não se vê todos os dias!”.

Antes de Stranded In Hell, que reabriria nova trinca de Game Over, John partilhou um desconforto: “Galera, eu nunca toquei com esta guitarra em frente a uma audiência”. E o que foi dito imediatamente após isso talvez ninguém tenha entendido, afinal de contas, imagine como soa um americano tentando falar espanhol para um público brasileiro… ficou claro apenas o “No me gusta”, ainda maldizendo a Flying V toda preta, em substituição ao seu modelo preto e branco tradicional, pois um corda havia estourado em Game Over. Então alguns exageros começaram a surgir, por exemplo: qual o objetivo em se subir ao palco para cumprimentar John Connelly no meio de uma canção? Fazê-lo parar de tocar? Estragar a música? Pior que foram dois casos… Sin arrancou novos urros gerais e Betrayal, com sua parte instrumental matadora, foi comicamente dedicada por John “à minha nova namorada”. E foi neste momento que algo inesperado e preocupante se deu: um fã mais ‘fortinho’ subiu ao palco e pediu para que a temerosa platéia o segurasse. E não é que ele se jogou? Pena não ter sido possível ver onde ou como ele caiu, nem apurar as consequências do heróico ato.

No rápido intervalo para hidratação, Nick fez um snippet de Criminally Insane, no prato, bumbo e caixa, em justíssima homenagem vinda de quem vestia camiseta estilizada com o logo da Heineken, mas com um “1964 – 2013 / Hanneman” grafado, anos de nascimento e morte do ex-guitarrista do Slayer, além de um “Angel Of Death” escrito e uma caveira com asas de anjo logo abaixo. Enquanto isso, John finalmente se reapossava de sua guitarra com cordas novas e ele ainda deu um jeito de tirar sarro do roadie, Paulo, que “superará o fato de ser vegano muito em breve”. Então o homem das quatro cordas anunciou que viria “uma música parcialmente nova, de Pounder: Analogue Man In A Digital Welt’”. Sim, Dan Lilker a citou misturando inglês com alemão. E quando ia explicar melhor, sob olhares perplexos de John, teve de começar a tocar porque Nick não quis nem saber, iniciando a música. E após a mais recente do set, do EP de 2015, o show literalmente virou festa com a informação de que era aniversário de Nick, com direito a ‘Parabéns a você’, em inglês. E quando você pensa já ter visto de tudo, o próprio baterista projetou o rosto à frente para que um roadie nele esfregasse o bolo. Incrédulo, Erik não se aguentava de tanto rir, enquanto pedaços da guloseima lambuzavam o kit e o aniversariante arremessava, por três vezes, nacos substanciais a ensandecidos fãs, já seguros de voltarem para casa bem mais sujos do que saíram.

Tentando botar ordem no recinto, Dan Lilker, outro a misturar idiomas, foi taxativo: “Ok, faltam algumas canções e talvez nós os vejamos ‘mañana’”. Passando o tempo até que a bateria fosse minimamente limpa, o baixista puxou o começo de Iron Man, acompanhado por Nick, até que este a interrompesse pedindo uma toalha para remover da cara as remanescências de chantilly com chocolate. Espirituoso, John explanou: “Desculpem-nos, o Nick tem que limpar seu rosto dessa ‘facial, a ‘facial grega’” (entendedores entenderão). Finalmente tocaram F# (Wake Up), ainda com bolo nos toms. Verdadeiro esporro, When Freedom Dies a sucedeu e, finalizando o set, o ‘poliglota’ Dan Lilker foi novamente sucinto: “Ok, ‘um poquito más’. Material rápido. Aproveitem”. Na prática, um ‘combo 3 em 1’ com as curtíssimas My America (em vocais divididos entre John e Dan), Hang The Pope (cantada exclusivamente pelo baixista) e Lesbians (outra com Dan Lilker no microfone). Todas de Game Over (embora a última só na versão cassete) e tão curtas que fizeram lembrar faixas de outro projeto do baixista, o S.O.D., ou Stormtroopers Of Death. Finalizando, ele simplificou: “Obrigado, São Paulo! ‘Uno más’. Esta se chama Trail Of Tears”. E nela tivemos a prova cabal de que o ‘fortinho/fofinho’ de outrora ainda estava no meio de nós, pois o ousado fã teve a audácia de fazer outro stage diving!! Ainda durante a execução da talvez mais elaborada faixa da noite, Dan fez novos agradecimentos: “Obrigado, São Paulo! Nós somos o Nuclear Fucking Assault” e, encerrado o show, foi a vez de o vocalista despedir-se: “Obrigado, senhoras e senhores. Boa noite!”.

Saindo das dependências da Comedoria, enquanto John Connelly e Erik Burke atendiam pedidos de fotos e autógrafos após descerem à área comum da pista, uma grata surpresa: o ‘fofinho true’ deixava o local aparentemente ileso, abraçado a um parça: “Você quase me acertou duas vezes!”. Ao obter como resposta um sincero “Foi muito louco!”, sua emoção sincronizava-se à expectativa daquele fã da entrada, setenta minutos depois. E ainda teria mais na sexta…

 

26/04/19

Alguns contrastes eram claramente perceptíveis no dia seguinte, como a ansiedade amainada nos arredores do Sesc. Porém, começado o show, a conversa era outra, pois as rodas estavam bem mais insanas e mais gente foi ao palco para se jogar do que na véspera (incluindo mais garotas), chegando ao inútil ponto de um segurança pedir para que parassem, ainda em Brainwashed, até John reautorizar as subidas. Antes de F#, que teve largada queimada, Dan Lilker voltou a relembrar os trinta anos dos shows no Dama Xoc e, vestindo camiseta do Sepultura, citou o conjunto brasileiro, agradecido aos fãs: “Obrigado por se lembrarem de nós”. O que mais rolou? O som não estava tão alto quanto na quinta-feira; antes de New Song, um sortudo fã foi agraciado com uma cerveja Colorado, entregue em mãos pelo vocalista, que voltava a achar que italiano é português (“Scusa, São Paulo!”); antes de Critical Mass, um maluco fez um stage diving virando estrela a partir do palco, até se jogar; antes de Game Over, nosso queridíssimo presidente foi homenageado com um “Fuck Bolsonaro”, em inglês mesmo, espontaneamente oriundo da platéia, até Dan Lilker dar sua contribuição: “E o Donald Trump”; e não houve pedaços de bolo arremessados, mas Nick repetiu a levada inicial de Criminally Insane.

No mais, um excesso gerou reflexão, pois qual sentido há em cinco pessoas subirem ao palco concomitantemente, como rolou no meio de Stranded In Hell? Tampouco sabe-se se foi encontrado o dono de um pé de chinelo perdido (e erguido) durante Analogue Man In A Digital World. Também não dá para perder a noção das coisas a fim de tentar um stage diving entre músicas, como feito por um fulano antes de F# (Wake Up), zoado por John: “Falta. Demorou. Cinco jardas”, aludindo à penalização do futebol americano para atraso no começo de uma jogada. Ao seu final, outro mico: na maior pureza, um gaiato quis cumprimentar Nick, que, distraído, tomou um tremendo susto ao notar alguém tão perto de si, por serem culturas diferentes: nos Estados Unidos, em ato similar, um maluco foi ao palco e perdemos Dimebag para sempre… então é evidente que um músico, mesmo sendo inglês, primeiro se amedronta e recusa o cumprimento, para só então descobrir tratar-se de ato inocente. Finalizando, não ficamos para ver se os músicos desceram à pista, como feito na véspera.

Quanto ao setlist, ambas de Game Over, After The Holocaust foi substituída por Radiation Sickness, “a música favorita do John”, segundo o baixista, e When Freedom Dies foi suprimida, sem troca, totalizando uma hora e cinco minutos de espetáculo. E para quem curtiu a iniciativa do Projeto Música Extrema do Sesc Belenzinho, contemplando a experiência de ver e ouvir metal com conforto e preços justos na lanchonete, basta tomar nota do próximo evento: em 11/05 por lá tocará o Mutilator, banda mineira formada em 1985.

 

Setlists

25.04.19

01) Rise From The Ashes

02) Brainwashed

03) F#

04) Vengeance

05) After The Holocaust

06) New Song

07) Critical Mass

08) Game Over

09) Butt Fuck

10) Stranded In Hell

11) Sin

12) Betrayal

13) Analogue Man In A Digital World

14) F# (Wake Up)

15) When Freedom Dies

16) My America

17) Hang The Pope

18) Lesbians

19) Trail Of Tears

 

26.04.19

01) Rise From The Ashes

02) Brainwashed

03) F#

04) Vengeance

05) Radiation Sickness

06) New Song

07) Critical Mass

08) Game Over

09) Butt Fuck

10) Stranded In Hell

11) Sin

12) Betrayal

13) Analogue Man In A Digital World

14) F# (Wake Up)

15) My America

16) Hang The Pope

17) Lesbians

18) Trail Of Tears

 
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