BEAT ao vivo: Uma viagem de volta à era dourada dos anos 80 do King Crimson
Texto: Flavio Santiago
Fotos: @marcosoliveirapht
Fotos: @reinaldocanato
Para quem viveu (ou descobriu depois) a fase mais ousada e experimental do King Crimson nos anos 80, assistir a um show da BEAT é como entrar em uma máquina do tempo — só que turbinada com potência moderna e músicos lendários. O projeto reúne ninguém menos que Adrian Belew, Tony Levin, Steve Vai e Danny Carey, em uma homenagem visceral aos álbuns Discipline (1981), Beat (1982) e Three of a Perfect Pair (1984).
Sim, você leu certo. É uma formação dos sonhos. E o show ao vivo faz jus à expectativa.
BEAT é mais do que uma banda tributo — é um reencontro de mestres que viveram e moldaram essa fase do King Crimson. Adrian Belew, guitarrista e vocalista icônico da época, está de volta ao centro do palco. Ao seu lado, o incansável Tony Levin, com seu Chapman Stick pulsante. Steve Vai entra na jogada adicionando sua marca técnica e criativa às guitarras entrelaçadas do Crimson, e Danny Carey, baterista do Tool, dá um peso e precisão que atualizam os arranjos sem perder a essência original.
O resultado? Uma celebração intensa, detalhista e apaixonada de uma das fases mais criativas do rock progressivo.
A noite começou com a intensa “Neurotica”, e a escolha já deixou claro que o show não seguiria pelo caminho mais fácil. O clima caótico, urbano, quase esquizofrênico da faixa tomou conta do ambiente, com Carey metralhando viradas desconcertantes e Belew entregando sua voz ainda afiada e teatral.
Na sequência, vieram “Neal and Jack and Me” e “Heartbeat”, equilibrando peso e melodia. “Heartbeat”, em especial, trouxe um momento mais sensível e atmosférico, com direito a palmas ritmadas do público embalando o refrão.
As menos lembradas, mas não menos impactantes, “Sartori in Tangier”, “Model Man” e “Dig Me” provaram que a banda não tem medo de mergulhar no material mais abstrato. Vai e Belew exploraram timbres e texturas como dois cientistas sonoros, enquanto Levin e Carey mantinham tudo firmemente ancorado na insanidade controlada que é marca registrada do Crimson.
Em “Industry”, o clima ficou sombrio e quase industrial, preparando o terreno para o gran finale do primeiro ato: “Larks’ Tongues in Aspic (Part III)”, com suas mudanças de tempo e riffs agressivos — um verdadeiro petardo.
Após um breve intervalo, a banda retornou com “Waiting Man”, inaugurando uma segunda parte marcada por grooves entrelaçados e atmosferas meditativas. “The Sheltering Sky” transformou o palco num transe instrumental, com Danny Carey extraindo sons tribais e etéreos de sua bateria eletrônica.
A trinca “Sleepless”, “Frame by Frame” e “Matte Kudasai” foi um dos pontos altos da noite — o público oscilando entre dançar, cantar junto e simplesmente contemplar. “Frame by Frame”, com sua métrica hipnotizante, levou os fãs à loucura, e “Matte Kudasai” trouxe a doçura melancólica que equilibra o set com perfeição.
Quando veio “Elephant Talk”, a diversão tomou conta. Belew, sempre performático, brincou com as palavras e arrancou risadas e aplausos da plateia. “Three of a Perfect Pair” manteve a energia em alta, e “Indiscipline” veio com uma introdução de bateria estendida que foi, simplesmente, uma aula de ritmo por Danny Carey.
O encore começou com emoção extra. Antes de “Red” começar, Belew puxou um improvisado e carinhoso “Happy Birthday to You” para Danny Carey, acompanhado por aplausos calorosos do público. Em seguida, a banda explodiu com a força bruta de “Red”, faixa pesada e sombria, que colocou a casa abaixo.
Para encerrar a noite, nada mais apropriado que “Thela Hun Ginjeet” — aquele groove urbano, tenso e quase falado, que resume perfeitamente a ousadia daquela fase oitentista do Crimson. O público saiu extasiado, com sorrisos largos e a certeza de ter presenciado algo raro.
A BEAT não apenas revive uma fase subestimada do King Crimson — ela reinterpreta, celebra e expande o legado deixado por álbuns que ainda hoje soam modernos, desafiadores e únicos. Com músicos desse calibre, cada música vira um espetáculo à parte.
É mais do que um show: é uma imersão artística, emocional e sonora num dos períodos mais ousados da história do rock progressivo.
SETLIST
Neurotica (King Crimson cover)
Neal and Jack and Me (King Crimson cover)
Heartbeat (King Crimson cover)
Sartori in Tangier (King Crimson cover)
Model Man (King Crimson cover)
Dig Me (King Crimson cover)
Man With an Open Heart (King Crimson cover)
Industry (King Crimson cover)
Larks’ Tongues in Aspic (Part III) (King Crimson cover)
Set 2
Waiting Man (King Crimson cover)
The Sheltering Sky (King Crimson cover)
Sleepless (King Crimson cover)
Frame by Frame (King Crimson cover)
Matte Kudasai (King Crimson cover)
Elephant Talk (King Crimson cover)
Three of a Perfect Pair (King Crimson cover)
Indiscipline (King Crimson cover) (extended drums intro)
Encore:
Red (King Crimson cover)
Thela Hun Ginjeet (King Crimson cover)