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Eluveitie ::: 15/02/19 ::: Carioca Club
Postado em 05 de março de 2019 @ 16:29


Texto: Vagner Mastropaulo

Fotos: Marcos Cesar

Som ruim assombra Tuatha de Danann e Fabienne Erni foi o assombro da noite folk metal

Antes de tudo, cabe dizer que este texto começou a ser escrito após o cancelamento do restante da turnê do Tuatha de Dannan com o Eluveitie (Belo Horizonte, Brasília e Curitiba) e o posterior agendamento de uma apresentação no Rio de Janeiro para 20/02. Informações acerca destas datas ficarão a cargo da produtora, bandas e veículos de imprensa especializada locais. Até por uma questão de justiça, a resenha focará apenas no que se passou no Carioca Club, em São Paulo, numa sexta-feira chuvosa que complicou a chegada do público. E quem está familiarizado com a casa, notou uma mudança estratégica: o setor de merchan no fundo da pista, entre a fila do bar e os banheiros (e não na lateral). No mais, tudo disposto como sempre.

Com horário oficial de entrada do Tuatha de Dannan às 20:30, imperou a pontualidade enquanto o público ainda tomava seus lugares e alguns arriscavam no figurino em vestimenta medieval. Formado por Bruno Maia (vocais limpos, flauta, whistle, guitarra, violão, bandolim e banjo), Giovani Gomes (baixo e vocais guturais), Edgard de Brito (teclados), Rafael Tchurtis (guitarra), Nathan Viana (violiono) e Rafinha Delfino (bateria), o grupo de Varginha abriu o set com Behold The Horned King após Nathan puxar seu começo interagindo com a platéia e a bateria de Rafinha soar como uma convocação a marchar. A sintomática falha no som da flauta de Bruno foi apenas o primeiro indício de que mais estava por vir e a versão mais alternativa e leve do que a de Tingaralatingadum (2001) praticamente serviu como introdução a Believe: It’s True!, de Trova Di Danú (2004), emendada e com a platéia participando com palmas enquanto o som da bateria, muito mais alto do que o dos outros instrumentos, se sobrepunha.

Teria sido importante registrar as primeiras palavras de Bruno, mas seu microfone estava tão embolado que só foi possível entender a honra em tocar na cidade mais uma vez e as propagandas da linha de hidromel do conjunto e do recém-lançado EP The Tribes Of Witching Souls – conversando com o staff do grupo no merchan, apurou-se que os próprios mineiros haviam recebido os EPs no dia do show. Enquanto isso as dificuldades técnicas ressurgiam durante a execução das duas primeiras de Dawn Of A New Sun (2015), mas nem as microfonias estragaram o clima de festa em We’re Back (há como não se contagiar com seu “Ô, ô, ô, ô”?) e Rhymes Against Humanity, sem microfonias, com mais da metade do Carioca preenchido e versos ainda contemporâneos: “The leaders who deceive us, they will bleed us ‘til we’re dead”.

Tan Pinga Ra Tan teve participação especial de Fernanda Lira e foi diferente vê-la de vestido preto, sem os tradicionais adereços thrash/death na indumentária da vocalista/baixista da Nervosa e poder ouvi-la em melodias limpas. O mais próximo disso talvez seja Wayfarer, em Agony (2016), e Selfish Battle, de Downfall Of Mankind (2018), e é claro que ela detonou no gutural ao vivo. O único senão foi o timing ruim, pois os fotógrafos poderiam ter registrado o momento, mas haviam saído do pit na anterior. Normalmente no espaço por três músicas, ficaram quatro e um “Não podiam ter liberado só mais uma?” pôde ser ouvido, com razão. Com muito custo, deu para ouvir Bruno anunciar: “Vamos fazer um som que está nesse disco que estamos lançando hoje aqui: Warrior Queen, beleza?”. Efetivamente, a primeira do novo EP no set, ainda com Fernanda no palco, assim como havia cantado no Sesc Belenzinho, sete dias antes, além de Abracadabra e Trova Di Danú, de improviso. A lamentar apenas os problemas técnicos que seguiram assombrando: sem som algum no banjo de Bruno, nem mesmo após inusitados gritos de “Banjo! Banjo” da galera, em apoio, o instrumento funcionou (e não ouse saber o que mais foi dito por ele, pois o som de seu microfone seguia zoado).

Marcando o meio da apresentação e já sem Fernanda, extraída do EP Tuatha De Danann (1999), Us foi a mais antiga e, com Bruno na flauta, nada melhor do que luzes verdes e amarelas iluminando uma canção sobre nós. Retirada de Dawn Of A New Sun, cuja capa era o bandeirão atrás dos dois kits de bateria (Rafinha tocava à frente do que seria usado mais tarde), em The Brave And The Herd o banjo de Bruno finalmente funcionou, a ponto de o público urrar de alegria ao reconhecer seu som antes do início. A esta altura, com casa cheia, o volume dos instrumentos estava mais bem equalizado e The Tribes Of Witching Souls foi seguida pela divertida Land Of Youth (Tir Nan Og), com o vocalista tocando seu whistle.

Cravando sessenta e cinco minutos no palco, as duas últimas foram duas viagens de Tingaralatingadum: The Dance Of The Little Ones e a dançante Finganforn (uma pedrada em seu final), após Bruno apresentar seus colegas. Giovani ainda pediu para todos se aproximarem para a tradicional foto frente à platéia, mas a versão orquestral de Your Wall Shall Fall (a hiddent track do EP em promoção) foi tesourada do som ambiente e não se pôde fazer o registro. Na real, a galera nem deu bola para as dificuldades encontradas e superadas pelo Tuatha de Danann, curtindo o performance numa boa, mas os músicos, especialmente Giovani e Bruno não pareciam nada felizes após o show.

Em resposta por email, o tecladista Edgard de Brito deu um parecer menos acalorado à nossa equipe: “A produção do Eluveitie (não os músicos) realmente não foi muito simpática, não nos deixou tirar a foto final e possivelmente encerrou a reprodução da música orquestral”. O depoimento complementou o que foi dito por Giovani assim que se deslocou à pista na quarta música do Eluveitie: “Nós não passamos o som”, e por Bruno, tão puto que nossa equipe optou por respeitá-lo após abordagem na última música dos suíços, sem questioná-lo sobre os problemas encontrados no Carioca. Agora é torcer para que nada dê errado na festa oficial de lançamento de The Tribes Of Witching Souls, no Manifesto Bar, dia 05/04 (segunda-feira de Carnaval), com as presenças já confirmadas de três vocalistas: May Undead (Torture Squad), Victor Emeka (Hibria e Soulspell) e de Fernanda Lira, novamente.

Após meia hora de intervalo, em sua quarta passagem pela cidade e voltando ao Carioca Club, onde tocou em abril de 2015, além de Chrigel Glanzmann (vocal gutural, bandolim, flauta, gaita, apito e bodhrán – um tambor tribal), único remanescente da formação original, integram o Eluveitie: Fabienne Erni (vocais limpos, harpa e mandola), Michalina Malisz (hurdy gurdy – ou viela de roda), Nicole Ansperger (violino), Rafael Salzmann e Jonas Wolf (guitarras), Matteo Sisti (gaita de fole e flauta) e Alain Ackermann (bateria).  Subindo ao palco às 22:10, a faixa-título de Ategnatos (palavra gaulesa para “renascimento”), ainda a ser oficialmente lançado em abril, foi síntese da apresentação: bateria fulminante de Alain e os guturais de Chrigel em contraste aos lindos vocais de Fabienne. Porém, sendo realista, o péssimo som afetava a performance do conjunto de Zurique (algo de bom tinha que vir de lá, além da podridão da FIFA), com a bateria – em especial a caixa – engolindo os outros instrumentos outra vez. King veio colada e manteve a animação, assim como Nil, também emendada e empolgante, com Alain detonando.

Com o Carioca ainda mais cheio, surpreendia o uso da capa de Evocation II – Pantheon (2017) como bandeirão, ao invés da capa de Ategnatos. Primeira cantada na língua gaulesa, a bela Omnos manteve o padrão em cronologia retrospectiva dos álbuns (pulando Helvetios, de 2012) e acalmou um pouco os ânimos com Fabienne começando a roubar a cena, assim como em Lvgvs, que abriu uma quadra consecutiva de Evocation II – Pantheon, a começar por Catvrix, reconhecida de imediato pelos fãs. E quem achava ser impossível melhorar ficou de queixo caído com Fabienne, sozinha no palco, em Artio, bastante aplaudida em seu final, em especial após o vocalista pedir por aplausos à cantora. Fechando a seqüência, com a banda toda de volta, Chrigel foi cuidadoso: “Obrigado, São Paulo! Enfim, o Brasil é um país muito cristão, certo? E ouvi que ainda há muita dor e tradição por aqui, correto? Por favor, juntem-se a nós na adoração a Epona”, a deusa celta da fertilidade, pondo a galera a bater palmas e dançar. E foi interessante notar alguns fãs, sabe-se lá como, cantando-a, mesmo na língua gaulesa.

Thousandfold escancarou as influências death/folk dos suíços, pôs a galera a cantar e foi emendada à outra de Everything Remains As It Never Was (2010): colecionando referências que vão do Baltimore Ravens à primeira temporada de The Following (com Kevin Bacon e o excelente James Purefoy), Edgar Allan Poe surgiu na tocante Quoth The Raven, especialmente pelo contraste de vozes entre Chrigel e Fabienne outra vez. E se a música sobre o Corvo como prenúncio da morte se mostrou acessível, The Call Of The Mountains talvez tenha sido o ponto alto, com o vocalista fazendo um pedido: “Para a próxima, precisarei de uma fácil ajuda: quero ouvir cada um de vocês, ok? Podem cantar conosco?”. Desnecessário dizer que, mais uma vez, Fabienne arrebentou, como em A Rose For Epona, a primeira de Helvetios (2012).

Kingdom Come Undone acelerou a festa, trouxe peso, abriu roda, trouxe mais influências death metal melódicas (um Dark Tranquillity com flautas), e foi seguida de Alesia, cujo início foi outro momento sensacional de Fabienne (tomara que a atual formação se estabilize, pois, com a reputada rotatividade de membros do Eluveitie, daria trabalho encontrar outra cantora à sua altura, se ela saísse do grupo). Dando um pouco de respiro aos colegas, apenas Alain ficou no palco para seu solo, curiosamente grafado como “Soloshizzle” no setlist de palco. Uma possível explicação para o fato seria a expressão “to be the shizzle”, algo como “ser excepcionalmente bom ou impressionante” em algo e, modéstia suíça às favas, assim foi o solo (há outro sentido para “shizzle”, mas convém ficarmos com o primeiro mesmo)!

Finalizando a parte antes do encore, a volta dos guitarristas, tocando com Alain foi o momento mais pesado da noite, até iniciarem Havoc, com dois bumbos insanos, mantendo o arregaço e finalmente trazendo boa equalização para os instrumentos. Única de Spirit (2006) e mais longa do set, Tegernakô não alterou o andamento das coisas, especialmente após Chrigel duvidar: “Quero ver se o Brasil consegue dançar conosco. Por favor, deixem-me ver”, com a bateria servindo de combustível para a roda. E falando em roda, houve tempo para outra, animal, em Helvetios, verdadeiro hino de guerra, antes de a banda deixar o palco.

Na volta, Rebirth foi uma paulada e, dedicada por Chrigel a cada um dos presentes e com o público a cantar seu título, Inis Mona – a única de Slania (2008) – foi a pá de cal de uma performance arrebatadora, com uma bandeira no Brasil pendurada na gaita de fole de Matteo, sob luzes verdes e amarelas e a galera pulando ensandecida. E na despedida às 23:40, Fabienne ergueu a bandeira, com a parte instrumental de Epilogue, derradeira faixa de Helvetios rolando no som ambiente, sem as falas iniciais. Sentiu falta de algo? Mais trabalhoso do que gritar “Mai-den! Mai-den!” ou “Se-pul-tu-ra!” e sem conseguirem chegar a um consenso, pois cada fã pronunciava o nome de um modo, não houve sequer um coro de “El-vei-tie, El-vei-tie”…

Por fim, os mais atentos devem ter notado que o line-up não incluiu o baixista Kay Brem. Afastado temporariamente e com o apoio de seus companheiros por estar incapacitado a lidar com stress há alguns anos e por ter “ferrado minha saúde mental e física durante a última década e nunca ter dado espaço suficiente para recarga”, conforme post no Facebook oficial do conjunto em 22/06/18, vale a pena dar um conferida em The Stigma Of Mental Health, um perfil criado pelo baixista também no Facebook para tratar do assunto e discorrer sobre HSP (Highly Sensitive Person, no inglês). Em resposta a um contato feito via Messenger de seu Facebook pessoal, o educado músico explicou: “Sinto muito, mas não pude estar novamente aí no Brasil. Amo tocar, mas as circunstâncias não foram tão boas enquanto sigo me recuperando. Espero estar de volta na próxima vez com a banda. Saudações!”. Força a ele! E Sláinte!!

 

Setlist

Tuatha De Dannan

01) Behold The Horned King

02) Believe: It’s True!

03) We’re Back

04) Rhymes Against Humanity

05) Tan Pinga Ra Tan [com Fernanda Lira]

06) Warrior Queen [com Fernanda Lira]

07) Us

08) The Brave And The Herd

09) The Tribes Of Witching Souls

10) Land Of Youth (Tir Nan Og)

11) The Dance Of The Little Ones

12) Finganforn

Outro: Your Wall Shall Fall (Versão Orquestral) [até ser abruptamente cortada]

 

Eluveitie

01) Ategnatos

02) King

03) Nil

04) Omnos

05) Lvgvs

06) Catvrix

07) Artio

08) Epona

09) Thousandfold

10) Quoth The Raven

11) The Call Of The Mountains

12) A Rose For Epona

13) Kingdom Come Undone

14) Alesia

15) Alain Ackermann’s Drum Solo

16) Havoc

17) Tegernakô

18) Helvetios

Encore

19) Rebirth

20) Inis Mona

Outro: Epilogue [última faixa de Helvetios, sem as falas iniciais]

 
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