Foi com atmosfera ritualística e precisão germânica que a banda Faun retornou a São Paulo para mais uma noite de encantamento sonoro, desta vez no palco do Carioca Club. A apresentação integrou a World Hex Tour, centrada no álbum mais recente do grupo, Hex, e marcou mais uma visita da banda ao Brasil — ao todo, essa já é a quarta passagem deles por aqui, sempre com casa cheia e público devoto.

Para quem ainda não conhece, o Faun é uma das maiores referências mundiais na fusão de folk, música medieval e elementos pagãos. Com três indicações ao Echo Awards, os alemães criaram uma assinatura única ao combinar instrumentos ancestrais como hurdy-gurdy, flautas e lira com sintetizadores e programações eletrônicas — tudo com forte inspiração em mitologias celtas, nórdicas e orientais. O resultado é uma sonoridade envolvente que ultrapassa fronteiras e estilos, agradando tanto fãs de música tradicional quanto entusiastas do dark folk e até do metal atmosférico.

A noite começou com “Baldur”, que já deu o tom da jornada: épico, envolvente e com apelo visual — os figurinos, as projeções e a iluminação azulada criaram uma ambientação quase cerimonial. “Diese kalte Nacht” e “Alba II” vieram em sequência, revelando um equilíbrio entre a vibração dançante e o lirismo melancólico.

Um dos destaques foi o solo de Stephan Groth, que levou o público a um transe instrumental hipnótico. A sequência com “Walpurgisnacht” e “Nacht des Nordens” trouxe aquele clima de celebração pagã que já virou marca registrada da banda — impossível não se deixar levar pelos ritmos circulares e refrões místicos.

O público, fiel e visivelmente emocionado, acompanhava cada faixa com reverência, como se estivesse participando de um ritual coletivo. A estreia ao vivo de “Nimue” foi um momento particularmente especial — silêncio respeitoso seguido de aplausos entusiasmados, como se todos ali soubessem que estavam presenciando algo único.

A reta final trouxe sucessos que os fãs mais antigos esperavam, como “Wind & Geige”, “Rhiannon” e “Odin”, todas cantadas em coro. No bis, “Wenn wir uns wiedersehen” trouxe uma nota emocional, quase de despedida, enquanto “Hymn to Pan” fechou a noite com força e espiritualidade, evocando a figura do deus pagão com uma intensidade quase teatral.

Saí do show com a sensação de ter participado mais de um rito do que de um simples espetáculo musical. Mesmo sem compreender todas as letras em alemão ou línguas arcaicas, a entrega da banda e a atmosfera criada no Carioca Club tornaram a experiência acessível e profunda. A Faun consegue, com maestria, fundir o antigo e o moderno, o terreno e o mítico — e faz isso com respeito, beleza e técnica impecável.

Foi um daqueles shows em que a música parece ter saído direto de algum canto perdido da floresta para ecoar no coração de São Paulo. E por uma noite, ao menos, todos nós nos tornamos parte desse encantamento.

Baldur
Diese kalte Nacht
Alba II
Stephan’s Solo (Solo)
Walpurgisnacht
Nacht des Nordens
Blaue Stunde
Andro II
Nimue (Live debut)
Odin
Iduna
Galdra
Wind & Geige
Rhiannon

Encore:
Wenn wir uns wiedersehen
Hymn to Pan